A semana começa sob impacto da declaração feita pelo presidente Jair Bolsonaro, no último sábado (2), de que pegou áudios da portaria de seu condomínio no Rio “antes que fossem adulterados”. A oposição já anunciou que vai entrar com representação contra Bolsonaro por obstrução à justiça.
Delegados também reagiram, nesse fim de semana, contra a interferência do presidente nas investigações do caso Marielle Franco e Anderson Gomes. Ainda repercute a defesa do AI-5 feita pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), alvo de representação no Conselho de Ética e no Supremo Tribunal Federal (STF). Nesse ambiente político, o governo entregará ao Congresso uma ambiciosa agenda econômica nesta terça-feira (5). “O presidente vai amanhã e anuncia um conjunto de iniciativas”, disse ao Congresso em Foco o líder do governo no Senado, Fernando Coelho (MDB-PE). O gesto simbólico também foi adotado por Bolsonaro na entrega da reforma da Previdência.
O desafio imediato do governo será blindar as propostas econômicas da crise política, agravada constantemente por declarações da família Bolsonaro e pela briga interna do partido do presidente. Ele já acena com a saída do PSL e as articulações para a criação de um novo partido. Devem ser direcionadas ao Senado três propostas de emenda à Constituição: a PEC Mais Brasil (pacto federativo); a PEC da emergência fiscal, que institui gatilhos para conter gastos públicos em caso de crise financeira na União, estados e municípios; e a PEC dos fundos, que revê os 281 fundos públicos.
Essas medidas devem ser encampadas por senadores aliados, já que, pela Constituição, esse tipo de proposição começa a tramitar pela Câmara.
Por falar em Câmara, para lá seguem a PEC da reforma administrativa, que remodela o serviço público de todos os entes, e um projeto de lei que traz um novo modelo de privatizações.
Veja os principais pontos dessas propostas, conforme o ministro Paulo Guedes adiantou à Folha de S.Paulo em entrevista publicada nesse domingo: -
Será proposta a criação de um marco institucional por meio de um conselho fiscal, a ser formado pelos presidentes da República, do Supremo Tribunal Federal, da Câmara, do Senado, do Tribunal de Contas da União e da associação dos tribunais de contas estaduais. O conselho se reunirá a cada três meses para avaliar a situação financeira dos entes federativos.
Criação de cerca de dez gatilhos para permitir o equilíbrio de despesas de estados, municípios e União. “A beleza é que damos duas ferramentas com essa PEC. A primeira, os gatilhos automáticos. Se estiver com risco de quebrar, trava a despesa. Não pode dar reajuste por dois anos, por exemplo. Mas tem mecanismos auxiliares para irrigar o estado ou o município em dificuldades. Pode ser oferecido um financiamento, uma antecipação da economia prevista no ajuste”, explicou o ministro.
Reforma administrativa, com o fim da estabilidade dos futuros servidores públicos, diferenciação maior entre o salário inicial e o do topo da carreira e a redução no número de carreiras. - Desvinculação do Orçamento, com a proposta de soma do gasto obrigatório com saúde e educação. “É mais um capítulo: desvinculação, desobrigação, desindexação. Descarimbar o dinheiro. Devolver os orçamentos públicos para a classe política. Hoje o Brasil é gerido por um software. Está tudo carimbado. Já está escrito quanto será gasto em educação, saúde, com salários. Me avisaram que não tem como desindexar tudo. A esquerda vai atacar. Vão vir para cima. Nesse caso, eu tenho de ceder. Dinheiro de saúde e educação tem muita demanda. Eu já recebi pedido desesperado de governador por dinheiro para saúde ou para educação.” - Redução no número dos atuais 281 fundos públicos. “A tendência é não mexer nos fundos constitucionais, mas deve ter uns 200 que são tiros para todos os lados. Além da dívida, eu gostaria de convergir para dois grandes fundos, um de infraestrutura, que chamo de fundo da reconstrução nacional, e outro fundo para a erradicação da pobreza.” -
Privatizações mais aceleradas (fast-track). A lista de empresas a serem desestatizadas ainda não foi concluída. De acordo com Paulo Guedes, as grandes estatais, inclusive a Petrobras, poderão ser privatizadas em um eventual segundo mandato de Bolsonaro. “Não agora. Num segundo mandato, o presidente vai considerar as grandes. Nós, da equipe econômica, queríamos tudo agora.”