Principal articulador do Congresso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem sido chamado por colegas de primeiro-ministro, tal seu poder para fazer as pautas andarem na Casa. E o seu protagonismo deve crescer ainda mais com o eventual isolamento do presidente Jair Bolsonaro, em rota de colisão com a cúpula de seu partido. Com Maia, quem também tende a se fortalecer é o chamado Centrão, grupo informal de partidos encabeçado por deputados de PP, DEM, PR, PRB, MDB e Solidariedade.
Para o cientista político Creomar de Souza, professor da Faculdade Mackenzie em Brasília, o rompimento entre Bolsonaro e uma ala do PSL reduz a cerca de 30 deputados o total de votos com os quais ele poderá contar, de fato, para aprovar suas propostas. Esse é o número de parlamentares que deve acompanhar o presidente caso ele decida mudar de legenda. Com os demais, ele terá de negociar voto a voto, a exemplo do que acontece hoje com as demais bancadas. “O Congresso tende a ficar mais forte. A Câmara está pacificada pela liderança do Rodrigo Maia. O Senado ainda está definindo para onde vai. No Senado é mais difícil de avaliar, porque há um descontentamento com a liderança do [Davi] Alcolumbre”, disse o professor ao Congresso em Foco.
Alcolumbre enfrenta a resistência de senadores que apoiaram sua eleição e se sentem frustrados com sua aproximação com forças que derrotou, como o senador Renan Calheiros (MDB-AL) e a ala mais fisiológica do MDB. Brigado com seu próprio partido ou fora dele, Bolsonaro deverá ficar ainda mais refém do Congresso, na avaliação de Creomar. “Tudo dependerá de como ele vai fazer o diálogo interinstitucional.
Hoje ele tem um partido com o qual não consegue dialogar, porque o PSL está mais preocupado em dar certo do que o governo dê certo”, acredita. Os desdobramentos da relação do governo com o Congresso, segundo o cientista político, vão depender do comportamento de Bolsonaro.
“Vejo hoje três cenários: 1 - tudo melhora, o governo aprende a ser governo, estabelece diálogo com o Brasil, monta algum tipo de base e avança; 2 - vamos até o fim do governo do jeito que está, votando no varejo, ou seja, fazendo arranjo e votando; ou 3 - há uma degradação do processo do jogo, isto é, a Presidência vai ficando cada vez mais fraca e o Congresso vai tocando o que acha mais importante”, afirma o professor, fundador da Consultoria Dharma.
Bolsonaro e seus líderes no Congresso reforçam sempre que o governo optou por não ter uma base formalizada, por acreditarem que isso é sinônimo do velho “toma lá dá cá”. Para o advogado e mestre em ciência política Marcelo Issa, coordenador da Transparência Partidária, esse modus operandi reforça o protagonismo do Legislativo. "É uma opção do presidente de munir a sua interferência no poder Legislativo, com essa nova dinâmica o resultado é o ganho de protagonismo do Legislativo", analisa Issa. O cientista político explica que, para tentar impedir o aumento desse protagonismo do Congresso, o presidente busca atuar sozinho, através de decretos.
"A tendência do Executivo é ele buscar tratar de determinadas matérias por decretos mais do que nas legislaturas passadas", diz. Dessa maneira, o que está acontecendo é que outro poder acaba sendo afetado, o Judiciário, pois o número de ação direta de inconstitucionalidade (ADI) só cresce e, com isso, além das derrotas no Legislativo, derrotas no Judiciário acabarão também respingar no Executivo e minar cada vez mais suas forças. "Se o Executivo não opera o sistema presidencialista de coalizão, com as ferramentas que teria para fazer de maneira legitima, ética e honesta, esse é o resultado", afirma Issa. Dessa forma, o Legislativo tende a aprovar pautas que lhe interessa e a rejeitar as matérias do governo. "O Congresso tem ganhado um protagonismo e os indicadores de sucesso do Executivo nas matérias que lhe interessa no Congresso Nacional não são satisfatórias", diz Marcelo. Bolsonaro acumula derrotas em medidas provisórias e derrubadas de vetos presidenciais.
Até o momento, nove vetos totais ou parciais de Bolsonaro foram derrubados pelo Congresso, um índice de 24%. A título de comparação, esse percentual era de 9,5% no governo Dilma e 14% na gestão de Michel Temer, conforme mostrou levantamento do Globo. Das medidas provisórias assinadas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, apenas três de 11 foram aprovadas, outro recorde negativo desde 2003. Com Bolsonaro mais isolado, o risco é de as derrotas aumentarem.