Os principais desafios para o produtor de azeite na Serra da Mantiqueira, no Sul de Minas, estão relacionados, principalmente, ao alcance de boas produtividades em anos consecutivos. A diversidade climática do Brasil e a variabilidade em termos de chuvas e temperaturas influenciam muito a produção.
Porém, mesmo com as barreiras enfrentadas na produção, algumas marcas de azeite da região estão sendo reconhecidas mundialmente, como a Verolí, de Sapucaí Mirim, e a Mantikir, de Maria da Fé. As duas produções estão entre as 500 melhores do mundo, conforme a edição 2025 do guia italiano Flos Olei.
A produção de azeites de oliva extravirgens no Brasil é bastante recente e limitada. A primeira extração do país foi realizada pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) em 2008. Por ser uma planta exigente em horas de frio, a oliveira se adaptou em regiões de grande altitude, como a Serra da Mantiqueira, e com o inverno bem definido, como o da Região Sul do país.
Quase a totalidade do produto consumido (99,7%) no Brasil é importada (veja abaixo o ranking dos países que mais produzem azeite no mundo). O país consome cerca de 100 milhões de litros de azeite por ano. A produção nacional corresponde a 0,6% dessa demanda, em torno de 600 mil litros, segundo o Instituto Brasileiro de Olivicultura (Ibraoliva).
A colheita da safra de 2024 na região da Serra da Mantiqueira se encerrou em abril e, de acordo com os dados da Epamig e da Associação dos Olivicultores, ficou em próxima a 150 mil litros na Região da Serra da Mantiqueira (Sul de Minas, São Paulo e Rio de Janeiro). Esse índice atinge mais de 60% desse azeite produzido em Minas Gerais e é um recorde na produção da região - embora seja baixo, quando comparado à demanda de azeites no Brasil.
Pedro Moura, pesquisador da Epamig, explica que conseguir conciliar os fatores climáticos com o manejo e cultivo da oliveira é um desafio.
“O grande empecilho para os olivicultores brasileiros é conseguir produzir em grandes quantidades a partir de uma boa produtividade por planta e por área. O azeite produzido por aqui é de excelência e qualidade. O desafio mesmo é conseguir fazer com que a planta tenha essa alta produção em anos consecutivos e para isso a gente ainda necessita de muita pesquisa, de muito trabalho de campo para que a gente consiga acertar em cultivos bem adaptados, em técnicas de manejo bem adaptadas, para manter a constância na produção em anos consecutivos”, explica.
O pesquisador avalia que o reconhecimento da qualidade dos azeites mineiros se deve ao manejo escolhido pelos produtores e aos cuidados na pós-colheita, no processamento e no armazenamento, que contribuem para manter a qualidade que vem do fruto.
“A gente vem aprendendo com a cultura a cada ano, desenvolvendo técnicas de manejo, estudando o controle de pragas e doenças, a indicação de cultivares, o aumento na produtividade, já que a qualidade vem se firmando cada vez mais. Também temos evoluído na parte da agroindústria e nos serviços de processamento e análises da curva de maturação, para a indicação do ponto de colheita da azeitona, e da qualidade dos azeites”, destaca o pesquisador.
Veja as histórias de três rótulos de azeite mineiros que se destacam internacionalmente:
De Sapucaí-Mirim para o mundo
O Azeite Verolí, produzido com as azeitonas cultivadas nos Olivais Alma da Mantiqueira, em Sapucaí Mirim, foi lançado em 2022 e figura pela segunda vez consecutiva no Guia Flos Olei. O nome - Veroli -, traz algumas referências: Olí de óleo e Vero de verdade, por se tratar de um azeite feito da forma mais pura possível, para preservar toda a qualidade e atributos bons para a saúde. A propriedade foi adquirida em 2016 por Vera Menegon e suas filhas Natasha e Luana.
“Já tínhamos o intuito de cultivar oliveiras, quando começamos a procura pela terra. Contamos com a ajuda de um consultor que avaliou aptidão do solo, nutrição, exposição ao sol, altitude, clima e uma série de outros fatores. Nos primeiros cinco anos, fizemos o plantio gradativo das oliveiras. Realizamos ainda um trabalho para recuperar áreas nativas e pequenos riachos da propriedade, que tinham secado em função de atividades de pastagem”, conta Luana Menegon, uma das sócias.
A olivicultora acredita que o fato de ter o próprio lagar ajuda a manter a qualidade do produto, que foi reconhecida também em concursos na Europa e no Hemisfério Sul.
“Nossas azeitonas são colhidas e extraídas no mesmo dia, nós controlamos 100% do processo, envasamos e rotulamos aqui. Produzimos em escala menor e estamos interessadas em seguir fomentando essa cultura do azeite artesanal, fresco. Queremos vencer desafios junto com a Associação dos Olivicultores dos Contrafortes da Mantiqueira (Assoolive), da qual fazemos parte, e com outros produtores e parceiros”, destaca Luana.
Ela afirma que os principais desafios da produção estão atrelados às exigências burocráticas, impostos federais e estaduais e os insumos direcionados ao envase.
“São desafios que gostaríamos de superar dentro do território nacional, buscando formas mais sustentáveis e de produção nacional, já que ainda temos que importar diversos insumos que não são produzidos no Brasil, o que dificulta e encarece bastante nossa produção. Outro grande desafio é fomentar a cultura do azeite fresco nacional, dado que é uma atividade recente no Brasil. Ainda temos que combater bastante desinformação divulgada sobre o setor, além de fraudes e comparações com azeites importados que não possuem o mesmo controle de qualidade nem o mesmo frescor e propriedades boas para nossa saúde”, finaliza.
Do topo da fazenda para o topo dos concursos
A história do Azeite Mantikir se iniciou em 2015, quando o proprietário Hebert Sales plantou as primeiras oliveiras em Santo Antônio do Pinhal, na região do Vale do Paraíba, no Estado de São Paulo. Em 2019, a Mantikir se instalou na Fazenda Tuiuva, em Maria da Fé, município onde o azeite também é extraído.
O rótulo ‘Mantikir Summit Premium’ conquistou o primeiro lugar na categoria Produção Limitada (até 2.500 litros) no concurso Evooleum 2024, realizado na Espanha. O concurso é considerado o “Oscar” dos azeites. Os diferenciais de manejo, clima e altitude garantiram alta qualidade ao produto na premiação.
O azeite, que tem acidez de 0,11%, é um blend formado com as variedades de azeitonas Arbequina, Coratina, Grapolo e Koroneike, e cultivadas a uma altitude acima de 1,9 mil metros.
As azeitonas que dão sabor ao Summit Premium são colhidas bem no topo da fazenda. A altitude elevada faz com que as plantas sejam submetidas a muitas horas de frio, cerca de 2 mil horas abaixo de 10ºC, e também de seca, já que em altas altitudes não há grande absorção de água pela drenagem muito boa. Dessa forma, o rótulo Summit Premium se destaca por ser um azeite bem equilibrado entre c”, pontua Hebert.
O primeiro azeite biodinâmico do país é mineiro
Extraído no Olivais de Quelemém, em Maria da Fé, o “Zet” (Azeite em árabe) é o primeiro azeite biodinâmico do Brasil. A história se iniciou em 2005, quando o médico, produtor biodinâmico e proprietário da Zet, Samir Rahme, comprou um terreno de 7,5 hectares, a 1,6 mil metros de altitude, no município conhecido por ser o mais frio de Minas Gerais.
O Zet é feito a partir de azeitonas orgânicas, certificadas pelo IBD, maior certificadora de orgânicos da América Latina. A qualidade dos azeites da marca já foi reconhecida em premiações internacionais como o Olio Nuovo Days Competition, em Paris (França).
Um produto é considerado biodinâmico quando seu processo de plantio e colheita não utiliza produtos químicos e leva em conta as fases da Lua e os signos do Zodíaco ao definir o cronograma de trabalho agrícola.
Samir Rahme conta que escolheu a agricultura biodinâmica por acreditar na sabedoria da natureza. Segundo ele, ter um produto biodinâmico significa produzir um alimento de acordo com os ritmos da natureza, sem forçar o seu ritmo, observando os movimentos planetários que irão influenciar cada safra.
“Em resumo, significa apresentar ao público consumidor, um produto limpo, vivo e saudável. Creio que hoje no Brasil temos 65 locais de produção biodinâmica. Esse número é ainda muito pequeno em relação ao tamanho e às necessidades do Brasil”, explica.
Após a produção, Samir afirma que o próximo passo é fazer as análises físico-químicas do produto para saber a quantidade de gordura e ácidos graxos presentes em sua composição e a concentração de ácidos polifenólicos - que dão qualidade ao azeite, são benéficos à saúde e previnem o envelhecimento precoce.
“Esperamos que os prêmios que os produtos mineiros vêm obtendo mundo afora , estimule novos produtores a adotar esse método que respeita tanto a natureza interna do ser humano , como a natureza exterior. Dessa forma, para nós, é um grande orgulho poder produzir um produto que é saudável para o homem e o meio ambiente”, pontua Samir.
Consumidor deve ficar atento
Diante das constantes notícias sobre adulterações e proibição de venda de algumas marcas, o consumidor deve se atentar a alguns pontos, como alerta o pesquisador Pedro Moura: “É muito importante que o consumidor opte por azeites que foram produzidos e envasados no mesmo local. Outra dica é comprar azeites mais novos. A data de produção mais recente sugere um produto melhor”.
O pesquisador recomenda atenção ao rótulo. “Na gôndola, os azeites de oliva, extravirgens, virgens e os óleos compostos ficam próximos. É bom conferir se o produto escolhido é realmente o pretendido. A garrafa também é um bom referencial, o vidro conserva a qualidade melhor que o plástico”.
Para finalizar Pedro Moura chama atenção para o preço. “O azeite é um produto que tem um elevado custo de produção, e isso se intensificou nos últimos anos com as sucessivas quedas de safra nas grandes regiões produtoras da Europa. O consumidor deve sempre desconfiar de azeites baratos e buscar marcas mais idôneas e já conhecidas, além daquelas que mais agradam ao próprio paladar”.
Veja quais são os maiores produtores de azeite do mundo
O Brasil está longe de estar entre os maiores produtores mundiais de azeite, mas se destaca quando o assunto é consumo - o país é o terceiro maior importador do produto no planeta.
Boa parte do azeite importado vem da Espanha, que responde por cerca de 40% da produção mundial, mas o Brasil também tem importado produtos de vizinhos sul-americanos e de países do norte da África.
Confira abaixo a lista dos dez maiores produtores mundiais, respectivamente, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO):
Espanha
Itália
Grécia
Portugal
Turquia
Marrocos
Tunísia
Síria
Argélia
Egito
Fonte: https://www.otempo.com.br