O feriado da Páscoa é tradicionalmente o período do ano com maior lucratividade para vendas de chocolates e doces em todo o país. Para muitos que perderam o emprego durante a pandemia do novo coronavírus e sofrem com a crise financeira vivenciada atualmente no Brasil, o negócio se tornou mais que uma ajuda na renda ao fim do mês.
O crescimento de pequenos empreendedores que veem uma oportunidade na venda de ovos de Páscoa e outros produtos como fonte renda é reflexo do momento crítico que o mercado brasileiro enfrenta como impacto da pandemia. De acordo com o censo IBGE de dezembro de 2020, o desemprego já atingiu 14,1 milhões de brasileiros e o número de empregados sem carteira assinada no setor privado chegou a 9,5 milhões.
Também como resultado dessa instabilidade econômica, neste segundo ano em que o feriado nacional é comemorado dentro do contexto da COVID-19, os donos de lojas de doces devem se preparar para uma queda nas vendas de 2,2% nos ovos de Páscoa, em comparação à mesma data do ano passado, com retração de 28,7%. Os dados são da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
Sofia Carbonara, de 22 anos, já conhecia bem os desafios do trabalho independente antes de criar sua loja on-line de guloseimas, a ‘Bombombom’. Antes da chegada do coronavírus no mundo, era manicure e atendia seus clientes em suas residências. Porém, para conseguir adotar as medidas de isolamento e garantir sua segurança e de sua clientela, o método ficou, no mínimo, complicado de se manter.
Em entrevista ao Estado de Minas, ela diz que trocou as unhas pelo mercado de chocolates para unir a necessidade de complemento da renda com a possibilidade de trabalhar dentro de casa.
"Foi o modo que eu achei de ter uma renda extra e poder estar trabalhando em casa para cuidar da minha filha, de 3 anos. Fiquei com medo no início de não conseguir. Nós vemos que todo mundo está passando por um momento apertado, mas decidi tentar, e graças a Deus está dando muito certo."
A ex-manicure já colhe os resultados do aumento da procura de ovos durante o feriado. Segundo Sofia, até o momento já entregou 30 pedidos e a expectativa é finalizar mais 60 encomendas até o fim do feriado. “Você nem respira direito. O tempo todo recebe encomendas, fazendo os ovos, montando as caixas, despachando pedidos. Tem muitos clientes novos vindo, vai ser ótimo para a clientela fixa aumentar.”
Após ser demitido de seu emprego no segundo semestre de 2020, Breno Fernandes, de 32 anos, teve que ampliar sua pequena venda de sobremesas entre amigos e familiares para transformar em sua principal, e única, fonte de renda.
Segundo o economista, mesmo com o negócio indo bem, seu principal objetivo para escapar do momento crítico econômico que milhares de brasileiros enfrentam é fazer as malas e se mudar para o exterior. Enquanto ainda reúne os recursos necessários para a grande mudança, sua loja de doces, a ‘Cozinha do Breno’, é quem possibilita seu ganho mensal.
“Eu deixei o emprego formal para ser independente, foi uma transição difícil porque essa nunca foi minha fonte principal de renda, e agora é. Não é a mesma coisa, mas está sendo de muita ajuda.”
O pequeno empreendedor impulsionou seu negócio no mercado de doces no final do ano passado. Fora da época de datas especiais, como a Páscoa, vende diariamente cupcakes e outras guloseimas. Neste fim de semana de Semana Santa, a expectativa é que os ovos aumentem o alcance de seu negócio. “Durante a semana, nossa taxa de venda é bem baixa, então a ideia de trabalhar veio justamente por ser um período maior de vendas. Trabalhando até de madrugada para conseguir pegar um público maior nesse feriado."
Uma situação parecida aconteceu com Viviane Martins, de 26 anos. Por causa do fechamento do comércio e a queda nas vendas neste momento de pandemia, a jovem perdeu seu emprego como vendedora de roupas femininas na Feira Shop do bairro Eldorado, em Contagem.
Para tentar recuperar sua renda mensal, ela foi convidada por sua tia, Sandra Martins, de 49 anos, que possui uma loja de sobremesas on-line chamada ‘Damasco Sobremesas’ para produzir ovos de páscoa. Segundo Viviane, "graças a Deus e aos amigos, tivemos um número bom de encomendas por ser o primeiro ano em que estamos trabalhando confeccionado os ovos".
Mais que família, parceiros de negócio
E quando dois membros de uma casa perdem seus empregos quase ao mesmo tempo? Foi o que aconteceu com uma família de Belo Horizonte. A criadora do projeto Silvânia Moura, de 51 anos, trabalhava em uma empresa de transportes executivos na capital mineira com seu marido Marcelo Oliveira, de 59 anos, mas a companhia fechou em agosto de 2020, devido à queda da demanda de serviços durante a pandemia.
Sem saída, decidiram então criar a loja on-line ‘Bombons Sil’, para ampliar a produção de bombons que, antes, eram feitos apenas para renda extra. Com ajuda do filho, agora também desempregado, Silvânia e seu marido investiram em cursos on-line gratuitos para aperfeiçoamento dos chocolates e formaram uma sociedade para ajudar na produção.
Neste feriado, apostam na venda de ovos de Páscoa para aumentar o lucro de faturação. "Vendo que o período mais esperado pelos confeiteiros é a Páscoa no ano de 2020, fizemos um teste de produção dos ovos no ano passado, e deu certo deu um bom retorno. Ao longo dos meses fomos nos preparando, aperfeiçoando, e estamos fazendo novamente’’, disse Silvânia.
A família é quem cuida de toda a produção, embalagem das encomendas e envio. Como o negócio teve um resultado positivo desde seu início, pretendem entrar em aplicativos de entrega, como o Ifood e o Uber Eats, para alcançar um público maior.
Silvânia também fala como o pequeno gesto da entrega do chocolate pode ajudar nesses tempos difíceis. "Recebi encomenda de uma pessoa que queria enviar um doce para um amigo que estava se recuperando de COVID-19, para acalentar o coração daquela pessoa. Teve até uma encomenda de um avô que presenteou enviando para todas as suas netas cestas recheadas de guloseimas nossas.’’