Problema grave nas áreas urbanas, onde cerca de 58% da população possui acesso a saneamento básico, o tratamento de esgoto é serviço público oferecido a menos de 30% da população rural, segundo números levantados pelo IBGE, em 2015 – último dado disponível. A falta de informações atualizadas e de soluções revela também, de acordo com especialistas no assunto, um "jogo de empurra" entre poder público e privado, que, há anos, tem deixado nas mãos do produtor rural a responsabilidade pela destinação dos efluentes.
“O fato de a gente não ter conseguido resolver o problema das áreas urbanas acabou renegando o saneamento rural ao último estágio de importância”, conta o presidente do instituto Trata Brasil, Édison Carlos ao destacar que, legalmente, o saneamento básico é uma atribuição do poder público municipal. Contudo, os contratos feitos junto a empresas privadas que recebem a concessão desse serviço quase nunca preveem a cobertura da área rural. “Se a gente já tem dificuldade de universalização na área urbana, imagina na área rural onde não tem a responsabilidade dessas empresas”, completa Carlos.
A solução mais comum encontrada pela população do campo, nesses casos, tem sido uma velha conhecida dos brasileiros: a fossa séptica. Eficaz para evitar doenças e contaminações no curto prazo, essa opção está, no entanto, longe de ser sustentável. “Quando o proprietário tem um pouco mais de conhecimento e recurso, manda o caminhão limpar a fossa. Senão ele fecha e abre outra e, com isso, vai tendo uma contaminação do solo. A parte líquida vai infiltrando no terreno e a parte sólida vai acumulando no fundo das fossas”, explica o presidente do Trata Brasil.
Uma vez contaminado o solo, os efeitos da falta de tratamento desse esgoto tem impacto direto nas cidades abastecidas pela água que cruza essas fazendas. “A água não tem fronteira. Ela vai carregando aquilo tudo e já chega com qualidade comprometida na área urbana”, destaca Carlos. E engana-se quem pensa que o problema é uma particularidade de pequenos agricultores. Mesmo em grandes propriedades o saneamento é tratado como última prioridade, como revela o pesquisador da Embrapa Wilson Tadeu Lopes da Silva.
“A gente tem muito que avançar na área rural e isso não é só em pequenas propriedades ou residências unifamiliares. Esses problemas também ocorrem em fazendas grandes porque depende muito da legislação local”, conta Silva, ao apontar os mesmos problemas levantados por Carlos. No meio rural, ele destaca que, diferentemente da cidade, o avanço do saneamento no campo depende da colaboração do produtor.
“O urbano, a prefeitura passa a rede de esgoto e a obrigação do munícipe é fazer a ligação e ele paga as taxas. No rural, você tem que ter o morador como parceiro. Ele tem que fazer parte desse processo, entender como funciona e, se tiver algum problema, ele precisa avisar. Não é simplesmente instalar uma unidade de saneamento que está resolvido”, observa o pesquisador, ao lembrar de algumas soluções disponíveis de reuso desses efluentes – inclusive desenvolvidas pela própria Embrapa. “O esgoto que vem do vaso sanitário ele é basicamente orgânico (fezes e urina) que facilmente você consegue fazer tratamento num sistema anaeróbico”, pontua Silva.