O presidente Jair Bolsonaro (PSL) decidiu fazer uma ofensiva em território quase todo comandado por governadores da oposição. Na semana seguinte aos maiores protestos de rua contra o governo, Bolsonaro fará a primeira viagem oficial ao Nordeste, para entregar casas populares e anunciar mais verbas para obras de infraestrutura. É nessa região que o presidente registra as piores avaliações – para 40% dos nordestinos, o governo é ruim ou péssimo, conforme o Ibope. O roteiro tomará toda a sexta-feira (24/05/2019). Em Petrolina (PE), Bolsonaro vai entregar um conjunto habitacional do programa Minha Casa Minha Vida. Em Recife (PE), deverá anunciar um acréscimo de R$ 2,1 bilhões ao Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste, a ser usado em obras de infraestrutura. Ao todo, o fundo passará a ter R$ 25,8 bilhões em 2019. Oficialmente, a viagem marcará o lançamento do Plano Regional de Desenvolvimento do Nordeste (PRDNE), elaborado pela primeira vez, no âmbito da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). O presidente vai ser reunir, no Instituto Ricardo Brennand, complexo cultural da capital pernambucana, com 11 governadores. Todos da região confirmaram presença – Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe. Além deles, irão os governadores de Minas Gerais e Espírito Santo, abrangendo parte do Sudene. Parlamentares nordestinos, que cobravam a ida do presidente à região, também estão sendo convidados. Na primeira entrevista após assumir o cargo, Bolsonaro disse que os governadores nordestinos não deveriam pedir dinheiro a ele. “Não venham pedir nada para mim, porque não sou presidente. O presidente está lá em Curitiba”, disse ele, em referência a Luiz Inácio Lula da Silva, condenado e preso na Lava Jato. Bolsonaro, porém, argumentou que não abriria uma guerra política para não prejudicar os eleitores. “Não posso fazer uma guerra com governador do Nordeste atrapalhando a população. O homem mais sofrido do Brasil está na região Nordeste. Vamos mergulhar para resolver muitos problemas do Nordest. A viagem de Bolsonaro foi precedida de encontros com esses governadores. Em uma reunião recente em Brasília, ministros palacianos apelaram por mais apoio à reforma da Previdência. Argumentaram que, apesar das diferenças políticas, não era mais tempo de “palanque”. Os governadores disseram entender a necessidade da reforma, mas cobraram proteção aos pobres do Nordeste. A região registra a maior taxa de desemprego no país: 15,3%, acima da média nacional, de 12,7%. E vem sofrendo com o arrocho no orçamento. Nos três primeiros meses do ano, Bolsonaro enviou R$ 242 milhões aos estados nordestinos. Sem descontar a inflação no período, foram 3,2% a menor frente ao mesmo período do ano passado, ainda na gestão de Michel Temer. Os números referem-se aos recursos para despesas discricionárias, que o governo pode ou não fazer. Não entram nessa conta as transferências obrigatórias. Em carta aberta após encontro com Bolsonaro em Brasília, os governadores do Nordeste reclamaram dos cortes orçamentários nas universidades e institutos federais, que motivaram as marchas de rua da semana passada, e solicitaram a retomada de obras rodoviárias, de segurança hídrica e habitacionais, como forma de combater o desemprego. “A pauta dele não tem nada a ver com a necessidade do Brasil. Dar arma a vereador, tem coisa mais velha que isso?”, comentou um governador, reservadamente, ao deixar o encontro. Em 2018, o petista Fernando Haddad venceu em todos os estados do Nordeste. Para reverter o quadro negativo, Bolsonaro encomendou aos ministros ações imediatas, além do plano de longo prazo. Agenda Nordeste Os ministros prepararam a Agenda Nordeste, um conjunto de ações de curto prazo – a maioria delas já existia em governos anteriores, mas será remodelada. Entre elas, estão a instalação de cisternas nas escolas (do Ministério da Cidadania), que também anunciou pagamento de 13º no Bolsa Família; a aquisição de alimentos da agricultura familiar e crédito fundiário (a cargo a pasta da Agricultura); ligação por internet em escolas rurais e o estímulo ao interesse por ciências ( Ciência e Tecnologia e Educação); e a Rede Cegonha, de atenção básica a mães e bebês (Saúde).
O Plano Regional de Desenvolvimento do Nordeste (PRDNE) é uma obrigação constitucional que começou a ser feita no governo Michel Temer. Documentos similares também foram elaborados pelas superintendências de desenvolvimento das regiões Centro-Oeste e Norte, mas Bolsonaro acolheu sugestão do ministro do Desenvolvimento Regional, Gustavo Canuto. Com base em critérios do IBGE, o plano estabelece 41 regiões prioritárias para investimentos, além das nove capitais dos estados. A ideia é que esses polos funcionem como indutores de geração de emprego, expansão do saneamento básico, diminuição das desigualdades de renda e de indicadores como mortalidade materno-infantil e analfabetismo. “Pensamos os problemas da região, identificamos os potenciais e áreas em que podemos aportar recursos de forma estruturante. A ideia é tirar de ações difusas, isoladas, e criar algo que sistemicamente faça sentido e desenvolva a região. Nos últimos 14 anos, foram investidos no Nordeste R$ 380 bilhões de recursos federais, como Bolsa Família, BPC, PAC. Muita coisa foi feita, mas se tivesse sido coordenado, muito provavelmente o resultado seria melhor”, diz Canuto. O PRDNE será transformado em lei após tramitar no Congresso Nacional, junto ao Plano Plurianual, planejamento de quatro anos elaborado no início de todos os governos. O horizonte de validade, porém, é de 12 anos. No dia 30 de maio, o documento será enviado ao Planalto e tem de chegar até agosto ao Congresso. Durante a discussão política, a Sudene, os governadores e as bancadas estaduais vão iniciar tratativas políticas para garantir o orçamento. “Aí, sim, haverá conjugação de esforços para definição de prioridades e das possibilidades de o orçamento atender as necessidades do Nordeste”, diz Mário Gordilho, superintendente da Sudene. A ideia é que o documento sirva como um portfólio de projetos prioritários para estimular aporte de verbas federais e estaduais. Ele passará a ser apresentado, por exemplo, para captação de emendas parlamentares.